Os traços de personalidade na avaliação de comunicação

 


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Trabalho durou 4 anos na Escola de Comunicação e Artes da USP com o tema “A relação de traços de personalidade com efeitos de recepção de propaganda” e desperta novas possibilidades para potencializar a performance de campanhas publicitárias.

 

Co-fundador e Head of Data Tech da Ilumeo, Diego Senise concluiu seu trabalho de doutorado pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade Federal de São Paulo (USP) em março de 2021. Em uma jornada de quatro anos, a pesquisa cobriu o assunto “A relação de traços de personalidade com efeitos de recepção de propaganda”, com orientação do Prof. Dr. Leandro Leonardo Batista. O assunto é pioneiro no Brasil e abre fronteiras na aproximação entre academia e mercado, uma das premissas da Ilumeo como uma consultoria de Data Science.

Entre as principais contribuições da pesquisa para o mercado estão as possibilidades de potencializar a performance de campanhas publicitárias, a partir da distinção de traços de personalidade do target, o que leva a novas maneiras não só de segmentar o público, mas de criar mensagens mais eficazes para cada um dos tipos.

Abaixo disponibilizamos um vídeo com uma entrevista mais aprofundada, em que o próprio Diego explica o método e os resultados da tese. Mas aqui aproveitamos para resumir os principais pontos.

Os traços de personalidade

A personalidade pode ser compreendida como um conjunto de inclinações ou disposições que são estáveis ao longo da vida de um ser humano e ajudam a explicar as diferenças de comportamento entre os indivíduos. A construção teórica mais aceita sugere que há cinco grandes traços de personalidade, os chamados Big Five. De forma básica e simples, são:

  • Extroversão: pessoa mais ativa, sociável, falante, extrovertida;

  • Amabilidade: pessoa mais sensível, amigável, carinhosa, que evita conflitos;

  • Conscienciosidade: pessoa mais focada, responsável, organizada, disciplinada, eficiente;

  • Neuroticismo: pessoa com mais instabilidade emocional, mais raivosa, reativa;

  • Abertura a Experiências: pessoa mais artística, curiosa, imaginativa.

Importante deixar claro que todas as pessoas têm esses traços de personalidade em maior ou menor grau e há um que predomina sobre os demais. Apesar desses traços não predizerem totalmente como uma pessoa vai agir no seu dia a dia, elas apontam uma tendência de comportamento do sujeito. O que Diego Senise fez nesse estudo foi a conexão dos traços de personalidade com a forma como as pessoas reagem a estímulos de comunicação.

 

Efeitos de comunicação

Pesquisadores científicos já haviam identificado que pessoas com o traço de Abertura à Experiência olham para questões mais abstratas de um estímulo de comunicação, seja ela um quadro ou uma propaganda. Já pessoas com traço de Neuroticismo focam mais em aspectos negativos da peça do que aspectos positivos.

Há três pontos essenciais que fazem uma grande diferença prática nas áreas de Marketing e Publicidade: na formação de target, na personalização de mensagens e na mensuração de campanhas. Afinal, se determinada empresa adotar a variável de traço de personalidade na composição de seu target, pode criar mensagens mais específicas para cada um deles, com mais chance de aumentar sua eficácia e seu retorno de investimento.

E isso também faz uma grande diferença com o contexto atual da mídia e da tecnologia, em que nos encontramos em um ambiente multi-tela e multi-task, com a necessidade de atrair a atenção dos usuários em poucos segundos por conta da dinâmica caótica das redes sociais.

Mas, a questão também vai muito além da comunicação empresarial, conversando inclusive com questões de públicas, como o próprio enfrentamento da Covid-19. Artigos científicos publicados em 2020, por exemplo, apontam que pessoas mais extrovertidas são as que permanecem mais tempo fora de suas casas e utilizam menos as medidas de segurança em relação à Covid-19, enquanto pessoas com alta conscienciosidade se protegem mais.  

Esse estudo pode fornecer insights para os próprios governos agirem na prevenção do alastramento do vírus, uma vez que é possível ir além das óbvias constatações de que os jovens saem de casa mais que os idosos e estão mais conectados aos meios digitais para serem impactados por campanhas. Aqui, seria possível mirar as campanhas publicitárias em pessoas com perfil de alta extroversão, separando-as de pessoas com perfil de alta Conscienciosidade para atingir pessoas com mais tendência à exposição a riscos.

 

Como mapear traços de personalidade no seu público?

Mas, na prática, como saber o traço de personalidade das pessoas? Há algumas formas de capturar dados e descobrir os traços de personalidade de uma pessoa. Algumas opções que podem ser utilizadas são formulários, ferramentas de eye-tracking ou data mining.

Importante, é claro, sempre ressaltar as questões éticas em torno do tema, da captura e utilização dos dados pessoais, para não se assemelhar ao escândalo da Cambridge Analytica. Os usuários sempre devem estar cientes e concordar com os estudos envolvendo seus dados e com a captura e utilização deles para fins publicitários.

Essa, no entanto, é uma discussão ainda bastante inicial no Brasil e um ponto central para o ecossistema de mídia discutir e lançar luzes em conjunto.

 

Experimentos inéditos

Para demonstrar cientificamente a força dessas relações em sua tese de doutorado, Senise realizou três estudos trait-content (relação traço-conteúdo):

A primeira pesquisa foi quantitativa com mais de 1.000 indivíduos e um estudo traço-traço (trait-trait). Teve o objetivo de identificar se há validade discriminante entre Ceticismo em Relação à Propaganda (um traço de comportamento do consumidor) e o Neuroticismo (um traço de personalidade). Validade discriminante identifica se ambos conceitos são realmente diferentes entre si ou se há uma relação estatística alta entre eles. Isso é importante para se ter certeza que uma pessoa está avaliando bem ou mal um propaganda por causa de seus traços de personalidade e não pelo fato de ser cético em relação à propaganda, que é um conceito conhecido desde 1998.

Os resultados mostraram um relação baixa entre os dois conceitos. Ou seja, há validade discriminante. Seguro em relação ao estudo trait-trait, Senise partiu com confiança para os próximos três estudos que tinham uma perspectiva traço-conteúdo (trait-content).”

O segundo estudo, um experimento, expôs um grupo de pessoas com traços de personalidades diferentes a dois tipos de propaganda: uma era informativa, com imagem de um casal assistindo à TV e cerca de 10 tópicos descrevendo as fetaures do aparelho; a outra era a mesma imagem, apenas com a mudança do texto, que tinha uma abordagem mais experiencial, com o apelo de “se sentir dentro de um cinema”. As duas sub-amostras eram semelhantes do ponto de vista demográfico e no nível de envolvimento com a categoria televisores. Ou seja, a manipulação das variáveis fez com que as duas células do experimento tivessem apenas uma diferença entre si: uma viu propaganda informativa e outra viu propaganda transformacional. Depois de avaliar as propagandas, as pessoas respondiam ao inventário dos 5 grandes traços de personalidade

O resultado é que pessoas mais extrovertidas avaliaram bem ambas as propagandas, mas as amáveis mostraram uma atitude mais positiva sobre a propaganda transformacional, com uma carga emocional maior.

E o terceiro experimento abordou as reações a propagandas comparativas vs não-comparativas. Apesar de não ser uma prática brasileira e acontecer de forma corriqueira no mercado norte-americano, foi observado que as pessoas com maior nível de Neuroticismo percebem as propagandas comparativas como mais conflituosas, falando mal dos concorrentes. Já as pessoas com baixo nível de neuroticismo têm uma atitude mais branda em relação à propaganda comparativa. Aqui, novamente, fica evidente que o traço de personalidade modera a relação da pessoa com estímulos de comunicação.

 

Mais sobre o estudo

Usando tecnologia de eye-tracking, o estudo de Diego Senise ainda apontou que as pessoas com grau mais alto de Neuroticismo procuram mais rapidamente o produto nas peças de propaganda e passam mais tempo olhando as características, não levando tanto em consideração as pessoas que estão na imagem. As pessoas com alta Conscienciosidade focam bastante nas características do produto e apresentam uma leitura mais linear das peças. Por outro lado, pessoas com baixa Conscienciosidade olham a peça de um lado para o outro, sem um foco específico.

“Os traços de personalidade são tão fortes, que se a saliência de um traço for mais elevada em nós do que em outra pessoa, vamos olhar a mesma coisa e interpretar de jeitos diferentes. Vamos prestar atenção em coisas diferentes e em ordem diferente. Se você aplicar isso aos primeiros cinco segundos de propaganda do YouTube, é possível orientar resultados mais eficazes só pela questão do olhar do usuário. Pode parecer algo muito específico, é claro, mas na ciência, nós vamos em um ponto muito específico para depois generalizar conclusões e inspirar outros estudos e a orientação do mercado”, contextualiza Diego na entrevista.

Conexão entre academia e mercado

A tese de doutorado de Diego Senise reforça a posição da Ilumeo, de fortalecer a conexão entre o ambiente acadêmico e de pesquisa das universidades com o mundo real dos negócios. Ele destaca que essa aproximação não é etérea e filosófica, mas sim Ciência Social aplicada, inclusive com papers científicos publicados nos Top Jornals mundiais com relevância prática mesmo no mundo corporativo.

“Geralmente, as pessoas pensam que é o caminho contrário, de levar os dados das empresas para os acadêmicos analisarem. É um caminho possível e super útil, mas o caminho contrário, do mercado se inclinar aos papers, geram muito resultados e isso é cultural, precisa insistir para que isso aconteça dia a dia. Na Ilumeo, fazemos isso há 10 anos e estamos colhendo os frutos, colocamos isso no framework de novos projetos, está embutida já no desenho de nossas consultorias, direto no way of working e também transformamos isso em produtos escaláveis, indo além da prestação de serviços, como propriedade intelectual da empresa. Isso é super trabalhoso, mas recompensa!”, conta Diego.

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