Science Review: Varejo

Selecionamos papers científicos da área de Varejo publicados nos principais journals do mundo, a fim de trazer o que há de mais novo e relevante na Ciência de Dados que pode contribuir para a utilização nas empresas.

 

O varejo foi tema do Science Review de abril de 2021, evento online promovido pela Ilumeo, onde são apresentados alguns dos mais recentes e relevantes papers científicos disponíveis nas principais publicações do planeta. Neste post, apresentamos as principais descobertas e insights contidos em duas dessas pesquisas internacionais de ponta, que possuem alto nível de aplicabilidade no dia a dia das empresas e que podem contribuir para o crescimento de varejistas de todos os tamanhos.

São assuntos nas áreas de comportamento do consumidor e psicologia de preço, com a curadoria de Evandro Lopes, consultor sênior de projetos da Ilumeo, PhD na área de Marketing e com passagens por C&C e Walmart. Vamos aos papers:

 

Paper #1

The upside of down – Presenting a price in a low or high location influences how consumer evaluate it

Esse paper investigou se a apresentação de um preço em um local baixo ou alto influencia a forma como os consumidores o avaliam.

Definir pricing é importantíssimo em qualquer estratégia de negócio. Muitas vezes, se o branding não consegue criar diferencial percebido, a estratégia se volta puramente ao preço. A questão é que, mesmo quando não se pode alterar o preço, é possível alterar a percepção que o consumidor tem dele. Esse é um dos pontos mais importantes da psicologia do consumo.

A percepção de preço por parte de um consumidor pode ser primária, quando há relação direta entre marca-produto, ou pode ser secundária, quando o varejista tem liberdade para mexer na apresentação do preço (formato de parcelas ou à vista, percentual do desconto ou desconto total, etc.). Os estudos clássicos mostram que os compradores avaliam o preço dentro de um paradigma apenas racional: o esforço que eu tenho para ter o dinheiro vs o benefício que o produto me trará, ou quantas horas de preciso trabalho para conseguir comprar aquele produto.

O campo do Behavorial Pricing mostra que a avaliação de preço é afetada por aspectos como apresentação do produto, cor, layout, estilo e tamanho de tipografia, entre outros fatores. É nessa parte de psicologia de consumo que o paper foca, trazendo a hipótese de que o preço, quando apresentado na parte inferior do produto, gera a percepção de ser mais barato do que quando é apresentado na parte superior. Isso vale também para a gôndola de um supermercado, a prateleira de uma loja, em um site ou aplicativo, por exemplo.

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Evandro Lopes explica que, metaforicamente, o nosso cérebro foi “programado” para fazer analogias sobre o posicionamento de subir e descer. Está embutido em nossa mente questões como “Fulano subiu na vida porque estudou muito”, “a temperatura subiu” ou “os preços caíram”, “hoje eu tô pra baixo”. Associamos um posicionamento vertical a um fenômeno físico da vida como cair/subir. E isso se manifesta também na nossa percepção de preço.

Na pesquisa, ao total, foram realizados seis experimentos para testar a hipótese inicial. Em um dos experimentos, foram entrevistados 91 estudantes, que foram divididos em 2 grupos, onde um grupo era apresentado a um produto com o espaço para preço na parte inferior e outro grupo era apresentado a um produto com espaço para o preço na parte superior. Eles deviam estimar os preços para os 2 produtos diferentes, no caso um café, com apresentação visual exatamente igual.  

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Os resultados mostraram que as estimativas foram mais baixas para os preços posicionados na posição inferior.

No 2º experimento da pesquisa foram entrevistados 205 estudantes. Divididos em 2 grupos, foram apresentados a um produto de higiene, com preços a vista, ou na parte superior ou na parte inferior da apresentação visual. Eles avaliaram quanto julgariam o preço ser caro ou barato.

Quando o preço estava na posição mais baixa, a percepção de preço também era de que o produto estava mais barato.

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Foram feitos mais dois experimentos diretamente em estabelecimentos varejistas. O primeiro foi feito com 9 itens de bebida alcoólica, testado por duas semanas. Em geral, houve a mesma percepção. O segundo, com itens de mercearia ao longo de 32 semanas, variando a exibição do preço acima ou abaixo da apresentação visual do produto e foi medida a intenção de compra, a avaliação de preço e a venda propriamente dita dos produtos.

Resultado final: A apresentação do preço na posição inferior de um produto leva a uma percepção de preço mais baixa, aumentando a intenção de compra e se concretizando no aumento efetivo em vendas no PDV – tudo isso sem afetar percepção de qualidade.

Nos sites de venda de varejistas, essa percepção também pode ser aplicada. Vejamos exemplos:

Não há padronização da apresentação de preço entre esses sites, porém, é possível afirmar, agora cientificamente, que é mais vantajoso para o varejista inserir o preço abaixo da apresentação do produto, independente da categoria de consumo.

Paper #2

Choice of prevailing delivery methods in e-grocery. A stated preference ranking experiment

Esse estudo aborda a escolha dos métodos de entrega predominantes nos mercados virtuais. Levando em consideração o cenário atual impactado pela pandemia, onde os estabelecimentos intensificaram ou criaram novas formas de entrega de seus produtos, como delivery, take away, entre outros.

Independente do crescimento dessas modalidades a pesquisa buscou saber qual o grau de aceitabilidade que os consumidores têm com elas, bem como a intenção de pagar mais nesses diferentes formatos.

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O estudo também avaliou outras variáveis como janela de tempo para entrega, características psicológicas de diferentes consumidores, diferentes mercados com níveis de maturidade em “e-grocery” e contextos de compra distintos. A pesquisa foi aplicada nos mercados da Grécia e do Reino Unido.

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Foram entrevistadas 537 pessoas em um experimento nos dois países. O estudo consistia em dois contextos: compra de “semana” e compra urgente, em que eram disponibilizadas seis opções e os consumidores precisariam ranqueá-las de acordo com suas preferências.

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Os resultados na Grécia mostraram que, tanto em compras urgentes como não urgentes, a preferência maior é pela modalidade “pick-up from lockers” em 1 hora sem custos adicionais. Em segundo lugar, o Home Delivery, com preferência por tempo de entrega diferente entre os cenários.

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Os resultados no Reino Unido são semelhantes, com uma diferença maior nas compras semanais, em que a preferência é por Home Delivery, onde o mercado já é mais estabelecido.

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Por fim, os resultados gerais comparando os experimentos mostram que:

  • Existe uma maior intenção a pagar por entregas Home-Delivery (3 euros) do que em Pickup Lockers (1,5 euros);

  • Consumidores mais conscientes com preço tendem a pagar menos em qualquer modalidade de entrega;

  • Usuários mais satisfeitos com Home-Delivery tendem a pagar ainda mais caro por essa modalidade (4 euros);

  • Não existe muita diferença de intenção de pagar mais entre consumidores que sentem mais ou menos a pressão do tempo.

 

Uma grande contribuição deste paper e de todos os outros é que o algoritmo final da pesquisa é aberto para qualquer pessoa utilizar em sua realidade:

Esses papers são muito ricos e merecem ser explorados pelas empresas com mais energia, principalmente no Brasil, onde a cultura de unir academia e mercado ainda é tímida. As pesquisas possuem implicações possíveis de replicação no mercado nacional e podem impulsionar bons resultados práticos nos negócios, ressaltando que os algoritmos utilizados são todos abertos, validados, testados e avaliados por pares antes da publicação nos top journals mundiais.  Inclusive, um grande número dessas pesquisas são parcerias entre empresas e academia, com a iniciativa privada valorizando o método científico e conseguindo dados confiáveis para amparar decisões de negócios.