Science Review: Mercado Financeiro

Selecionamos papers científicos da área de Finanças publicados nos principais Journals do Mundo, a fim de trazer o que há de mais novo e relevante na Ciência de Dados que pode contribuir para a utilização nas empresas.

 

De quando em quando, a Ilumeo faz um evento chamado Science Review, em que elenca alguns dos mais recentes e relevantes papers científicos que podem jogar lux sobre determinados assuntos. A última edição abordou o mercado financeiro como objeto de estudo.

Trouxemos à tona experimentos e pesquisas que podem contribuir para alavancar empresas do setor financeiro e quaisquer outras organizações, pois o princípio por trás dos papers tem aplicabilidade geral. Neste post apresentamos a síntese de quatro deles.

 

Paper #1:

Frontiers: Machines vs. Humans: The Impact of Artificial Intelligence Chatbot Disclosure on Customer Purchases

 

Em um experimento para descobrir se existe diferença de performance entre um robô (chatbot com Inteligência Artificial por voz) ou um profissional humano, vendendo por telefone, foram analisadas ligações de venda feitas para 6.200 pessoas. O serviço era empréstimo pessoal de umas das top 20 empresas do setor na China. Todas as pessoas já eram clientes e estavam chegando ao fim da quitação do empréstimo – haviam pago 11 das 12 parcelas, de um valor entre US$ 800 e US$ 2.500. A contratação era finalizada através do aplicativo da empresa instalado nos smartphones dos clientes.

Ao telefone, o robô simula a linguagem natural humana com boa qualidade, incluindo o tom de voz, ritmo da fala, escolha de palavras de acordo com a interação com o cliente, mantendo um bom diálogo com seu interlocutor. Tudo desenvolvido de forma a não perceber que é um robô. Esse foi o Processo de Venda seguido:

 

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Após o contato via telefone, o cliente precisava entrar no app e confirmar a compra. A conversão entre as pessoas que confirmaram na ligação e confirmaram, posteriormente, no app, foi de 99%.

Todas as ligações foram realizadas em horário similar, entre 14h e 16h.

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Na figura acima, vemos que os clientes que receberam as ligações foram divididos em seis grupos. Cada um dos grupos possuía características semelhantes, como valor contratado, nível educacional, idade, etc., a fim de gerar uma boa comparação.

 

  • Grupo 1 (underdogs): os 20% piores vendedores do call-center;

  • Grupo 2 (proficiente agentes): os 20% melhores vendedores em performance;

  • Os outros quatro grupos são de robôs. O Grupo 3 são as ligações em que não se avisava que o atendente é um robô, se identificando como um agente de serviço.

  • Para os clientes do Grupo 4, o robô se identificava no início da ligação.

  • Para o Grupo 5, o robô se identificava ao final da conversa, mas antes da confirmação da venda.

  • Para o Grupo 6, o robô avisava depois que o cliente decidiu sobre a venda.

Os resultados podem ser vistos na imagem abaixo:

 

Conclusões do Estudo:

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Os resultados sugerem que os chatbots não divulgados são tão eficazes quanto os trabalhadores proficientes e quatro vezes mais eficazes do que os trabalhadores inexperientes em gerar compras do cliente. No entanto, a divulgação da identidade do chatbot antes da conversa entre a máquina e o cliente reduz as taxas de compra em torno de 80%.


 

Paper #2:

Social Networks within Sales Organizations: Their Development and Importance for Salesperson Performance

 

Embora o estudo do desempenho do vendedor tradicionalmente se concentre nas atividades e nos relacionamentos com os clientes, os estudiosos recentemente propuseram que os relacionamentos e atividades intraorganizacionais dos vendedores também desempenham um papel vital no desempenho das vendas.

 

A figura abaixo ajuda a visualizar a rede de relacionamentos dos vendedores:

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A hipótese: será que o vendedor A vende mais que o vendedor B, por estar em uma posição diferente na rede de relacionamento com os próprios vendedores da empresa? O vendedor B conhece mais gente diretamente, enquanto o vendedor A conhece apenas duas pessoas diretamente, agindo como “ponte” entre um grupo e outro.

Foram utilizados os dados de 286 vendedores em uma análise de rede social exclusiva.

Modelo conceitual do estudo

 

O resultado aqui é: vendedores com melhores habilidades de relacionamento vendem mais. Ter habilidades como influência interpessoal e construção de relacionamento é preditivo de fechamento de venda em torno de 10% a mais do que não possuir essas habilidades. Cruzar isso com o estilo de networking, centralizado ou relacional, mostra que a rede centralizada (B) funciona muito melhor para venda.

 

A dificuldade aqui para analisar a fundo é conseguir os dados certos. Dados de traço de personalidade se conseguem através de testes e avaliações de perfis ou uma auto avaliação em um formulário, por exemplo. Já os dados de redes de relacionamento não são tão simples quanto abrir o Google Analytics e pegá-los. É preciso construir a partir de dados não estruturados, como troca de e-mails, agenda de reuniões e outras informações subjetivas.

 

Aqui, percebemos que a Ciência de Dados não é exclusivamente sobre tecnologia. É sobre vendas. É sobre utilizar os dados disponíveis na empresa (inclusive os ‘escondidos’ a olho nu) a fim de extrair insights que elevem os resultados. Para isso, é necessário muito mais do que tecnologia, mas muito conhecimento do negócio, de estratégia corporativa e também dos métodos científicos.


 

 Paper #3:

Propensity of contracting loans services from FinTech’s in Brazil


Essa é uma pesquisa brasileira, inclusive com envolvimento de um dos consultores da Ilumeo, Evandro Lopes. A partir dos dados de 507 clientes, foi possível traçar um perfil das fintechs brasileiras de empréstimos e também estimar os antecedentes da propensão a utilizar este tipo de serviço.

 

A pesquisa não leva em consideração a marca e nem a oferta de empréstimo. Ela analisa traço e contexto dos clientes, aspectos como confiança, inovação pessoal, utilidade percebida, facilidade de uso e influência social, bem como as características que os precedem, como privacidade, estigma e distância transacional. Esses itens explicam 41,5% da propensão de usar serviços de empréstimos de Fintechs no Brasil.

 

Organizando as variáveis em um modelo regressivo conjunto, temos a figura abaixo:

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Metade da decisão de compra dos aspectos considerados (51%) é pela percepção de utilidade (perceived utility) de que aquilo vai resolver o problema do cliente e também elo perfil de inovação (personal innovation) da pessoa, que leva em conta consideração se a pessoa é contra a bancarização, por exemplo, ou por já ter feitos movimentos de utilizar serviços financeiros inovadores. O modelo indica que a escolha de fintechs para empréstimos pessoais não tem muito a ver com idade, escolaridade, gênero, mas sim com os traços que cada pessoa tem em sua personalidade.

 

A Privacidade também se mostrou com um impacto bem grande em dois principais aspectos de predição de consumo: a privacidade de dados e a exposição pública.


 

Paper # 4:

The impact of social influence on the relationship between personality traits and perceived investment performance of individual investors: Evidence from Indian stock market

 

Este paper produzido na Índia aponta que os traços de personalidade não são causa de comportamento, mas são inclinações e propensões a tudo que faremos na vida: carreira, relacionamento amoroso, consumo, etc. Ela se baseia em uma compreensão de cinco tipos de personalidades:

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Aqui, vale ressaltar que cada pessoa tem um pouco de cada personalidade, em maior ou menor grau. Por exemplo: extrovertidos são mais propensos a fazerem investimentos bancários, não é regra, mas é uma inclinação mais preditora de consumo do que os amáveis.

Esses traços de personalidade são levadas em consideração em termos de Marketing e também em pesquisas porque mudam pouco em uma pessoa durante o tempo. São traços estáveis nos seres humanos depois do período da adolescência. Afinal, ninguém deixa de ser extrovertido do dia para a noite, não é mesmo?

Há algoritmos que são capazes de traçar nossa personalidade através do que escrevemos nas redes sociais. Um extrovertido fala mais de festa e um introvertido fala mais de animes, por exemplo. Inclusive, esses algoritmos são utilizados até para prever suicídio. Geralmente, acontece quando as pessoas falam muito “eu”, “mim”, indicando que, quando estão deprimidas, estão mais centradas em si mesmas.

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Esse mesmo princípio de personalidade é utilizado para a área de Business. Neste paper, foi utilizado um formulário com 21 corretoras de investimentos e seguros na India, com 396 clientes. Os pesquisadores queriam identificar se a personalidade tem a ver com a propensão em fazer investimentos financeiros, somada à variável de influência social, se a pessoa é influenciada por amigos e familiares ao tomar decisões.

O que ficou evidente é que cada traço de personalidade tem uma relação positiva ou negativa quanto à performance de investimentos.

Por exemplo, vejamos a figura abaixo:

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O eixo vertical é a percepção da performance de investimento. Em vermelho, pessoas com alto nível de influência social, ou seja, aquelas muito influenciáveis pela opinião dos outros para tomar decisões.

Das pessoas com mais influência social, quanto mais extrovertidas, mais elas têm uma percepção de que é bom o investimento que estão fazendo. Para as pessoas com baixo nível de extroversão, o mesmo investimento é encarado como mau negócio. E nas pessoas com baixo nível de influência social, a opinião dos outros sobre os investimentos não muda a sua percepção, mas o que pesa aqui é a sua personalidade.

O indicador de investimentos é igual, ele não muda. O que muda é como a pessoa interpreta esse indicador. Pessoas diferentes têm diferentes percepções sobre a mesma realidade. O que foi percebido aqui é que o traço de personalidade das pessoas influencia a sua percepção sobre os investimentos.

Entre as pessoas com mais influência social, quanto mais traços da personalidade amável tem a pessoa (gráfico b, acima), menos ela vê como bom o investimento que está fazendo. Isso influencia em baixa recompra, baixa indicação, baixo NPS, porque ela não liga muito para a opinião alheia, mas o que importa é a sua percepção.

 

Aplicabilidade

A pesquisa é bastante específica sobre o tipo de personalidade relacionada a investimentos, mas a aplicabilidade do conceito pode ser bem vasta. Por exemplo, é possível identificar o estilo de personalidade através de perguntas específicas em formulários ou nas redes sociais. É importante estar em conformidade com a LGPD e buscar suporte jurídico para não violar nenhum direito de privacidade.

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Com os traços de personalidade mapeados, é possível se comunicar com as pessoas de maneiras personalizadas, que se conectem melhor à sua personalidade. É possível utilizar um modelo probabilístico para mensurar os traços de personalidade de acordo com os padrões de navegação em um website, por exemplo, onde vamos perceber que pessoas com a personalidade X prestam mais atenção a mensagens negativas e são mais críticas, portanto tendem a visitar sessões do site e conteúdos diferentes em relação a pessoas da personalidade Y.

É possível ainda enviar e-mails customizados para diferentes personalidades ou mesmo criar anúncios com criativos diversificados, visando alcançar as personalidades que mais se aproximar do seu cliente ideal. Uma pessos mais extrovertida vai responder melhor a uma mensagem que tenha a ver com networking, por exemplo, e uma pessoa com traços de neuroticismo vai se conectar melhor a mensagens que aflorem emoção.

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Ao estudar todos esses papers, ressaltamos que ter dados integrados do ponto de vista de sua natureza é um grande diferencial. Isoladamente, os dados de venda, ou os dados financeiros, ou os dados de satisfação dos clientes, vão contar uma parte da história. A sacada aqui é trabalhar tudo de forma integrada, como partes de um mesmo quebra-cabeça.

Por exemplo, uma inovação que chega ao mercado brasileiro agora foi apresentada em um paper científico de 2010, que propõe a integração de dados econométricos através do Marketing Mix Modelling, com dados psicométricos das pesquisas de Brand Tracking, a fim de entender qual o peso da marca e dos investimentos em mídia para a performance de vendas.

A integração de dados é importante para vislumbrar nuances de negócios que, de forma isolada, não é possível. Por exemplo, integrar dados de NPS, com CRM e com dados econômicos de resultados financeiros, a ponto de dizer: se eu aumentar 1 ponto do meu NPS, os meus clientes vão comprar X% a mais e isso vai me render X milhões a mais de faturamento anual, através de upsell ou de indicações.

Outra dica é extrair dados de áudios e estruturá-los para gerar insights. São muitos os dados não estruturados existentes em áudios que contribuem no processo da ciência de dados. Se você quiser aprofundar mais, pode ler nosso case com a Youse, onde analisamos ligações de venda do call center e sua relação com o churn de clientes e também o nosso estudo sobre pesquisas por voz, uma forte tendência.

Por fim, esses papers científicos nos mostram que a integração entre academia e mercado precisa avançar no Brasil. Está mais do que provado que há potencial para gerar otimizações de resultados e inovações por aqui.

A Ciência de Dados é um campo multidisciplinar que integra a área de negócios com o conhecimento científico para extrair insights contidos em grandes quantidades de dados, a fim de apoiar tomadas de decisões que podem gerar melhores resultados em uma organização. Fora do Brasil, principalmente, a academia atua na vanguarda da Ciência de Dados, através de pesquisas, experimentos e descobertas que permitem a aplicação nas empresas de projetos relevantes embasados no rigor do método científico.

Em terras nacionais, a Ilumeo busca realizar essa ponte entre academia e mercado e conta com cerca de 50 profissionais em um time multidisciplinar de engenheiros, programadores, psicólogos, estatísticos e cientistas de dados, conectados à universidades, fazendo ou orientando cursos de mestrado ou doutorado, produzindo papers e protagonizando a produção científica e a inovação. No setor financeiro, já construíram cases com empresas como XP Investimentos, Youse, Banco do Brasil, Santander, Porto Seguro, entre outros.