Para lidar melhor com as solicitações excessivas de dados sob demanda é preciso acabar com dois vilões: as más práticas e as ferramentas que as perpetuam.
Vamos abordar aqui um problema bastante comum dentro das empresas: a sobrecarga do setor de dados, que acaba recebendo muitas solicitações ‘ad-hoc’ (sob demanda) de outras áreas. E o pior: muitas vezes com coisas que não são produtivas ou relevantes para o funcionamento do negócio. Consequentemente, isso gera impactos significativos na produtividade da equipe, além de reduzir o resultado que a área poderia gerar na organização, caso ela se envolvesse apenas com assuntos realmente importantes.
Basicamente, as solicitações de dados ad-hoc são consultas feitas em um banco de dados solicitadas no momento em que surge uma necessidade específica. Contudo, apesar de auxiliar a cumprir uma determinada tarefa ou ação dentro da empresa, as questões de produtividade mencionadas precisam ser resolvidas de alguma fora. Mas como?
Para entender melhor, tomaremos o exemplo de Robert Yi, ex-cientista de dados do Airbnb, que escreveu um artigo para compartilhar como era a rotina dentro da organização em relação a esse tipo de problema e como ele foi, aos poucos, resolvido.
Em sua experiência, ele argumenta sobre a efetividade de alterar a forma como se compartilha o trabalho dentro da empresa, o que pode levar a um corte drástico e significativo no número de solicitações ad-hoc que os profissionais recebem todos os dias. Para isso é preciso acabar com dois vilões: as más práticas e as ferramentas que as perpetuam.
O problema de usar as ferramentas erradas
Muitas vezes, as ferramentas utilizadas para compartilhar o trabalho dos cientistas de dados são extremamente ineficazes. Segundo Yi, essas equipes de dados fazem, com frequência, as mesmas reclamações:
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Os dashboards não são utilizados;
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A documentação compartilhada não é consultada;
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As mesmas análises são solicitadas dezenas de vezes.
Apesar desses problemas serem realmente comuns, para todos eles existe um outro lado da moeda. No caso dos dashboards, muitas vezes essas informações estão fora de contexto, ou nadando em um oceano de outros painéis de dados, também sem contexto.
Já em relação à documentação, é possível que seus resultados estejam inacessíveis ou escritos em uma linguagem técnica demais, o que torna necessária a sua orientação para analisar os dados presentes lá.
Em terceiro lugar, o problema da recorrência. Sim, é possível que as mesmas análises estejam sendo solicitadas diversas vezes, mas isso provavelmente acontece porque as pesquisas são difíceis de serem realizadas, com esses dados estando perdidos em documentos na nuvem ou, no pior dos casos, despejados em conversas na ferramenta corporativa de chat. Ou seja, o problema é a forma como compartilhamos. E muitas dessas solicitações ad-hoc poderiam ser evitadas se o seu trabalho estivesse mais acessível para quem está fora da sua equipe.
Talvez seja o momento de admitir que muitas das ferramentas que adoramos usar no dia a dia (paineis, IDEs, google docs) não são boas quando o assunto é acesso compartilhado, transparência e governança.
Sim, um problema é resolvido quando você envia uma informação via Slack para um colega, e este profissional obtém o retorno que estava procurando. Mas esse tipo de compartilhamento acaba sendo privado e específico para aquele caso, o que significa que, se esta informação for necessária no futuro, é bem possível que você receba uma nova solicitação ad-hoc sobre a mesma questão. Afinal, se você é a única maneira de alguém encontrar, entender ou modificar o seu trabalho, prepare-se para uma enxurrada de pedidos semelhantes.
Como lidar com as deficiências de ferramentas de compartilhamento
De acordo com Robert Yi, para resolver este tipo de deficiência a respeito das ferramentas de compartilhamento, uma ótima solução é, justamente, estabelecer e adotar padrões mais rígidos sobre como entregar o trabalho. Quase sempre o instinto é resolver a questão e fornecer uma resposta rápida, mas muitas vezes a melhor saída é trazer certos elementos para a mesa na hora em que essas solicitações ocorrem. São eles:
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Contexto: explique o que, por que e como as consultas são inúteis sem o contexto para o qual são geradas. Embora muitas vezes seja tentador despejar painéis e dados sem o contexto necessário, isso geralmente leva a novas dúvidas e solicitações, além de interpretações erradas sobre os dados.
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Transparência: a transparência é uma condição necessária para ter uma conversa em torno de uma análise. Por isso, gráficos e dados nunca devem ser entregues sem as consultas usadas para gerá-los. Além disso, certifique-se de fazer o trabalho em SQL, garantindo a reprodutibilidade dos dados sem atrito.
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Descoberta: coloque seu trabalho onde os outros possam encontrá-lo. Isso significa que seu trabalho precisa ser “encontrável”. Uma das razões pela qual você recebe solicitações ad-hoc repetidamente é porque, possivelmente, ninguém consegue encontrar o seu trabalho depois que ele é entregue. Por isso, publique as entregas em um local central, bem rotulado ou tagueado. Isso deve reduzir redundâncias e abrir um canal para autoatendimento no futuro.
Seguindo estes três passos simples, certamente seu trabalho se tornará muito mais simples, e o número de solicitações ad-hoc caia drasticamente. Contexto, transparência e capacidade de descoberta são os pilares que faltam demais em um contexto de análise colaborativa, e fazer essas pequenas mudanças no seu dia a dia pode ter um impacto significativo na produtividade da equipe.
Perguntas que você pode fazer – e que vão melhorar seu fluxo de trabalho
Por outro lado, mesmo com ferramentas ideais e bem implementadas, o outro problema que se impõe é a urgência das solicitações. Para conseguir fazer um filtro a respeito das solicitações a serem tratadas como urgentes e não tão urgentes assim, é possível fazer 4 perguntas objetivas. Elas te ajudarão a decidir a relevância do pedido e se ele precisa ser atendido imediatamente.
1. Qual é o motivo comercial do pedido?
É importantíssimo pedir ao seu solicitante para descrever por que deseja determinado dado. Além de buscar entender melhor o contexto e atuar de forma inteligente, sem se colocar como um “tirador de pedido”, isso tem um impacto pragmático na produtividade. Entendendo o porquê e não apenas o quê, é possível trazer uma solução mais rápida e direta ao ponto, gastando menos recurso da equipe de dados.
2. As análises ou relatórios solicitados são os corretos para responder à questão?
O solicitante pode ou não ter experiência em análise, mas você é o especialista. Portanto, depois de saber o motivo da solicitação, deve conferir se os relatórios solicitados são realmente os necessários para resolver a questão. Enfim, independentemente da abordagem, certifique-se de confirmar os requisitos com sua parte interessada antes de fazer o trabalho.
3. Qual o nível de esforço e o tempo necessário para atender a solicitação ad-hoc?
Uma boa prática é listar as tarefas que devem ser realizadas e fornecer uma estimativa de tempo para concluí-la. Em seguida, traçar a linha do tempo com base na equipe que fará o trabalho, levando em consideração seus cronogramas. Lembre-se que a maioria das pessoas pedirá as solicitações o quanto antes, mas somente você pode definir esses parâmetros e informar quanto tempo precisa para fazer esta tarefa.
4. Qual o processo de admissão e avaliação para novas solicitações?
Por fim, é ideal que você tenha um processo de admissão formal para novas solicitações, no formato de um formulário que contenha as informações que você precisa avaliar. Isso é importante para avaliar e definir o seu processo de trabalho, além de comunicá-lo a seus stakeholders. Afinal, se você não tem processo, limites ou regras básicas, não pode esperar que outras pessoas delimitem essas regras por você.
Portanto, se quisermos construir organizações analíticas mais robustas, abertas à colaboração e confiáveis, é preciso trabalhar de uma forma que não prejudique os esforços deste trabalho. Por isso, adotar padrões melhores e trabalhar de forma a permitir conversas mais abertas e acessíveis com seus stakeholders é uma forma de melhorar significativamente o seu trabalho – e sem praticamente nenhum esforço.