A tomada de decisão baseada em inteligência artificial

 


Estudos revelam que o nosso jeito de tomar decisões impacta diretamente na utilização de IA nas organizações e que ter recomendações de qualidade dos algoritmos é apenas metade do caminho

 

As tomadas de decisões nos negócios estão cada vez mais complexas, envolvendo mais partes interessadas ou mais escolhas a serem feitas. Logo, para 65% dos líderes de negócios, as escolhas que precisam fazer não conseguem acompanhar o contexto da rápida mudança em que as decisões de negócios são tomadas hoje, conforme pesquisa da Gartner de 2021.

Isso acontece pela crescente dinâmica e digitalização dos negócios modernos, principalmente em um contexto de pandemia, onde muitas cosias mudaram ao mesmo tempo. Assim, é preciso que decisões tomadas hoje não sejam baseadas na consciência da situação de ontem, mas reflitam ‘o aqui e agora’.

Assim, a Inteligência Artificial assume um lugar ainda mais relevante nas decisões de negócio. A Gartner segmenta três graus em que a IA pode ser implantada nessa jornada visando decisões mais rápidas, consistentes, adaptáveis e em escala. As diferenças residem nas técnicas analíticas usadas em vários pontos do processo de decisão e quem em última análise, toma a decisão:

  • Automação de decisão. O sistema toma a decisão usando análises prescritivas ou preditivas. Seus benefícios incluem velocidade, escalabilidade e consistência na tomada de decisões.

  • Aumento de decisão. O sistema recomenda uma decisão, ou várias alternativas de decisão, para players humanos, usando análises prescritivas ou preditivas. Seus benefícios estão na sinergia entre o conhecimento humano e a capacidade da IA de analisar rapidamente grandes volumes de dados e lidar com a complexidade. 

  • Apoio à decisão. Humanos tomam a decisão, apoiados por análises descritivas, diagnósticas ou preditivas. Seu principal benefício reside na aplicação combinada de percepções baseadas em dados e conhecimento humano, experiência e bom senso, incluindo intuição e emoções.

 

Se uma decisão pode ou deve ser automatizada, aumentada ou com suporte da IA, depende de duas variáveis principais: tempo ou a rapidez com que a organização precisa de uma decisão; e complexidade. A dimensão de tempo se refere ao intervalo entre o momento em que a organização reconhece uma ameaça ou oportunidade e quando decide o que fazer a respeito e age. O intervalo de tempo varia entre microssegundos, no caso de negociação de ações de alta frequência; semanas, no caso de decisões salariais; e meses ou mesmo anos, no caso de fusões ou aquisições estratégicas.

 

Os estilos de tomada de decisão

Há 5 anos, menos de 10% das grandes empresas adotavam o aprendizado de máquina ou outras formas de IA, mas hoje 80% delas fazem uso dessas tecnologias. Essa tecnologia preditiva pode ajudar os executivos a lidar com a complexidade crescente das escolhas estratégicas, oferecendo novas perspectivas e percepções para consideração, o que pode ajudar as organizações a obter vantagem competitiva.

A Salesforce, por exemplo, usa seu próprio programa de IA, chamado Einstein, para ajudar os líderes a tomar decisões importantes. De acordo com o fundador e CEO da empresa, Marc Benioff, em entrevista ao MIT, os processos de tomada de decisão da companhia mudaram completamente desde que a IA foi introduzida. A orientação do Einstein, seja sobre o desempenho de diferentes regiões ou produtos ou sobre novas oportunidades de negócios, tem ajudado a reduzir significativamente os vieses e as discussões orientadas por políticas ou agendas pessoais entre os membros da alta administração.

Porém, o que um estudo do MIT descobriu é que as pessoas fazem escolhas totalmente diferentes com base em inputs idênticos da Inteligência Artificial. Inclusive, com impacto financeiro. Dependendo de seu estilo particular de tomada de decisão, alguns executivos investem até 18% a mais em iniciativas estratégicas importantes com base em conselhos de IA.

Existem quatro estilos principais de tomada de decisão que o estudo levou em consideração: os tomadores de decisão racionais são estruturados e lógicos em sua avaliação dos desafios estratégicos. Em contraste, os tomadores de decisão intuitivo-espontâneos confiam em suas emoções e tendem a tomar decisões no impulso do momento. Os executivos dependentes buscam ajuda e apoio de outras pessoas ao tomar decisões, enquanto os líderes “evitativos” adiam a tomada de decisões. 

A pesquisa mostra que essas tendências moldam as decisões dos executivos de maneiras inesperadas quando eles interagem com as recomendações baseadas em IA. No estudo, 140 executivos dos EUA foram confrontados com uma decisão estratégica idêntica: investir em uma nova tecnologia que lhes permitiria buscar novas oportunidades de negócios em potencial. Os participantes foram informados de que um sistema baseado em IA com a tarefa de avaliar oportunidades de negócios recomendou o investimento na tecnologia. Por fim, os executivos foram questionados qual seria a probabilidade de investir na ferramenta e, se decidissem, quanto dinheiro estariam dispostos a comprometer, além da contribuição de IA no processo.

Os resultados ilustram que os executivos diferem significativamente em quanto inputs eles exigem de sistemas baseados em IA e na probabilidade de investir com base em suas recomendações Ao mesmo tempo, exigem diferentes níveis de autonomia ao fazer escolhas. Os tipos racionais parecem relutantes em perder autonomia no processo, enquanto os executivos evitativos, que normalmente adiam as decisões, ficam felizes em delegar a responsabilidade pela tomada de decisões à IA. Outros adotam as recomendações de IA e demonstram confiança em fazer escolhas estratégicas sem o envolvimento de algoritmos.

Esses resultados sugerem que os executivos que usam IA para tomar decisões estratégicas se enquadram em três arquétipos com base em seu estilo de tomada de decisão individual.

Os céticos não seguem as recomendações baseadas em IA, preferindo controlar o processo por si próprios. Esses gestores não querem tomar decisões estratégicas com base na análise realizada pelo que percebem como uma caixa preta que não entendem totalmente. São muito analíticos e precisam compreender os detalhes antes de se comprometer no processo de decisão. Ao usar a IA, podem ser vítimas de uma falsa ilusão de controle, o que os leva a serem muito confiantes em seu próprio julgamento e subestimar a IA.

Os interactors equilibram sua própria percepção e os conselhos do algoritmo. Eles estão abertos ao uso de IA, mas não dependem inteiramente dela e veem os inputs dos algoritmos como uma das muitas ferramentas à sua disposição ao fazer escolhas importantes. Quando as análises baseadas em IA estão disponíveis, estão dispostos a confiar e tomar decisões com base nessas recomendações.

Os delegadores transferem amplamente sua autoridade de tomada de decisão para a IA, a fim de reduzir o risco individual percebido. Para esses executivos, o uso de IA aumenta significativamente a velocidade do processo de tomada de decisões estratégicas e pode interromper um impasse potencial. No entanto, os delegadores também podem usar indevidamente os algoritmos para evitar responsabilidade pessoal. Essa mudança de risco do tomador de decisão para a máquina pode induzir riscos injustificados para a empresa.

Esses diferentes arquétipos de tomada de decisão mostram que a qualidade da recomendação de IA em si é apenas metade do caminho. Como os executivos entendem e agem de acordo com esse conselho é igualmente importante. Uma aplicação direcionada da inteligência artificial pode clarear discussões e reduzir o peso da opinião pessoal, mas com base em nossos estilos habituais de tomada de decisão, o uso de algoritmos também pode nos levar ao erro. Na jornada para construir uma empresa data-driven, as variáveis humanas ainda são as mais importantes do processo.

 

Os modelos de tomada de decisão com IA

Há poucos anos, o julgamento humano era o processador central da tomada de decisões de negócios – isso acontece, na realidade, ainda hoje em muitos casos. Logo, o processo de tomada de decisão era, aparentemente, simples, como aborda Eric Colson, ex-vice-presidente de ciência de dados e engenharia da Netflix, em artigo na revista de negócios Harvard Business Review


Em resposta ao novo ambiente em que vivemos, rico em dispositivos conectados, tecnologias e dados, adaptamos nossos fluxos de trabalho para algo similar a sermos orientado por dados. O julgamento humano ainda é o processador central, mas agora ele usa dados resumidos como uma nova entrada:


Colson entende que precisamos evoluir ainda mais e trazer a inteligência artificial para o fluxo de trabalho como um processador primário de dados. Para decisões rotineiras que dependem apenas de dados estruturados, é melhor delegar decisões à IA, por ser menos propensa ao viés cognitivo humano. 

Ela pode ser treinada para encontrar segmentos na população que melhor explicam a variância em níveis finos, mesmo que não sejam intuitivos para nossas percepções humanas. Ela também não tem problema em lidar com milhares ou mesmo milhões de agrupamentos e está mais do que confortável em trabalhar com relações não lineares, sejam elas exponenciais, leis de potência, séries geométricas, distribuições binomiais ou outras.


Esse fluxo de trabalho aproveita melhor as informações contidas nos dados e é mais consistente e objetivo em suas decisões. Ele pode determinar melhor qual criativo de anúncio é mais eficaz, os níveis de estoque ideais a serem definidos ou quais investimentos financeiros devem ser feitos, por exemplo.

Embora os humanos sejam removidos desse fluxo de trabalho, é importante observar que a mera automação não é o objetivo. Isso até pode reduzir custos, mas é apenas um benefício incremental. O valor da IA é tomar decisões melhores em relação ao que os humanos, sozinhos, podem fazer.

Colson reflete ainda que remover humanos de fluxos de trabalho que envolvem apenas o processamento de dados de estrutura não significa que estejam obsoletos. Existem muitas decisões de negócios que dependem de mais do que apenas dados estruturados. Declarações de visão, estratégias da empresa, valores corporativos, dinâmica de mercado são exemplos de informações que só estão disponíveis em nossas mentes e transmitidas por meio da cultura e outras formas de comunicação não digital. Essas informações são inacessíveis à IA e extremamente relevantes para as decisões de negócios.

Por exemplo, a IA pode determinar objetivamente os níveis de estoque corretos para maximizar os lucros. No entanto, em um ambiente competitivo, uma empresa pode optar por níveis de estoque mais altos, a fim de proporcionar uma melhor experiência ao cliente, mesmo em detrimento dos lucros. Em outros casos, a IA pode determinar que investir mais em marketing terá o maior ROI entre as opções disponíveis. No entanto, uma empresa pode optar por moderar o crescimento para manter os padrões de qualidade. As informações adicionais disponíveis para os seres humanos na forma ou estratégia, valores e condições de mercado podem merecer um afastamento da racionalidade objetiva da IA.

Nesses casos, os algoritmos podem ser usados para gerar possibilidades das quais os humanos podem escolher a melhor alternativa, dadas as informações adicionais às quais têm acesso. A ordem de execução desses fluxos de trabalho é específica para cada caso. Às vezes, a IA é a primeira a reduzir a carga de trabalho em humanos. Em outros casos, o julgamento humano pode ser usado como entradas para o processamento de IA. Em outros casos ainda, pode haver iteração entre a IA e o processamento humano.


A chave é que os humanos não estão interagindo diretamente com os dados, mas com as possibilidades produzidas pelo processamento dos dados pela IA. Valores, estratégia e cultura é a nossa maneira de conciliar nossas decisões com a racionalidade objetiva. É melhor fazer isso de forma explícita e totalmente informada. Ao alavancar a IA e os seres humanos, podemos tomar decisões melhores do que usar qualquer uma delas sozinha.