Diante de um ambiente tão sofisticado, pode ser desafiador fazer algo óbvio como começar pelo básico
Em tempos em que somos inundados com tantas notícias e conteúdos de como as empresas sofrem verdadeiras revoluções a partir do uso de dados, é comum que quase todo mundo queira estar por dentro do hype. Mas a questão é que é possível desbloquear muito valor com análises mais simples, sem precisar investir tanto inicialmente em ferramentas, cientistas de dados, inteligência artificial e todo esse aparato. Até porque, praticamente ninguém começa nesse ponto. Alguns chegam em um estágio avançado depois de uma jornada longa.
O empresário e data scientist Alexandre Titus escreve no Medium que:
“em mais de 90% dos casos, as pessoas que ouvem o termo análise avançada acham que deveriam entrar nesse trem. Infelizmente, isso pode ser uma perda de tempo e recursos da sua empresa até que você realmente precise deles”.
O ponto aqui não é desestimular que as empresas avancem para um estágio mais avançado no uso de dados, mas sim que comecem de um lugar possível antes de sonhar com totó o potencial que data science pode entregar. É sobre adotar a velha regra de bolso 80/20. Em essência, ganhamos 80% de qualquer benefício com apenas 20% dos insumos. Esse é o caso também quando se trata de análises.
Quando se está começando a entender o negócio e trabalhando para desenvolver um método de gerenciamento baseado em dados, é possível obter 80% dos insights que deseja com 20% do esforço. Esse esforço de 20% pode ser uma estatística resumida básica sobre quantos usuários há, quantas vendas foram feitas ou qual foi a receita bruta durante um período de tempo. Então, só depois de maximizar a capacidade de entender o negócio e seus clientes com o trabalho básico, aí se deve passar para um estágio mais avançado de análises.
Fazendo análise do zero
Para começar a implementar as análises “do zero”, caso não haja nenhuma estrutura disso na empresa, há algumas questões que podem servir de guia, conforme escreve Peter Gostev.
Os objetivos irão evoluir à medida que entendermos que é possível e sensato e o que não é, mas é bom começar a formar uma ideia do que se gostaria de alcançar.
Os principais objetivos iniciais podem girar em torno de:
-
Criar relatórios básicos (por exemplo, usuários, conversão, receita);
-
Permitir que os usuários de negócios respondam às suas próprias perguntas sobre dados;
-
Criar uma única fonte para todos os dados e obter uma visão única de um cliente;
-
Encontrar maneiras de tornar a vida mais fácil para futuros cientistas de dados que se juntam a essa equipe;
-
Minimizar o tempo de desenvolvimento de tecnologia e obter tudo isso a um custo razoável para uma startup ou pequena e média empresa.
No começo, as empresas podem não conseguir obter insights básicos porque os dados não estão lá ou não estão prontos para serem usados. Esse é um bom passo a ser vencido antes de atrair talentos como cientistas de dados, pois corre-se o risco de profissionais altamente qualificados gastarem seu tempo limpando e reunindo os dados.
Estágios para análises
Tristan Handy aborda como criar a competência analítica dentro da organização. Para ele, CEO da Fishtown Analytics e com larga experiência no setor, as análises de dados dão poder a cada decisão dentro empresa, da estratégica à tática, da sala da diretoria aos funcionários da linha de produção.
Logo, não se trata apenas quais métricas monitorar, mas de como fazer com que a empresa as produza. Em artigo no Medium, Handy propõe uma abordagem estágio por estágio de como as startups devem fazer suas análises.
Estágio de Fundação
(0 a 10 funcionários)
Nesta fase, não há recursos e nem tempo. Há um milhão de coisas que poderia ser medido, mas a única coisa aqui é que preciso ter certeza de que está medindo é o produto, porque são as métricas dele que ajudarão a iterar rapidamente nesta fase crítica. Todo o resto pode ficar em segundo plano.
O que fazer
-
Instalar o Google Analytics (GA) no site por meio do Gerenciador de tags do Google . Os dados não serão perfeitos sem mais trabalho, mas não é o momento certo para se preocupar com isso.
-
Se for um e-commerce, o GA pode fazer um trabalho decente de rastreamento, desde o visitante até a compra, portanto, dedicar algum tempo para ter certeza de que está certo e trazendo bons dados.
O que não fazer
Não comprar um data warehouse, uma plataforma de BI, um grande projeto de consultoria e nenhuma extravagância nesse sentido. Aqui é importante manter o foco. Haverá muitas perguntas que simplesmente não será possível responder ainda. E tudo bem por enquanto.
Estágio muito inicial
(10 a 20 funcionários)
A equipe está crescendo. Essas pessoas precisam de dados para fazer seu trabalho e podem ou não ser especialistas. O importante aqui é ter certeza de fazer certo as coisas básicas.
O que fazer
-
Certificar-se de que o time ou a pessoa de marketing possua acesso e bons dados no GA. Importante rastrear as UTM de todos os links criados para trackear as origens dos acessos aos sites e canais da empresa. Mesmo que ninguém seja especialista nesta parte de performance, há informações suficientes na web sobre o GA para se aprender e descobrir.
-
Se houver um ou dois vendedores usando um CRM, a dica é criar relatórios integrados. Aqui o foco é saber coisas básicas como produtividade dos representantes e taxas de conversão por estágio. Tentar manter o máximo possível de dados no próprio CRM, sem utilizar planilhas de Excel. Isso fará a diferença para análises de dados futuras.
-
Se houver alguém na área de Customer Success, é importante escolher KPIs que possam ser medir facilmente dentro da interface das ferramentas de suporte, help desk ou similar.
-
Importante monitorar a satisfação do cliente, pode ser usando o famoso NPS.
O que não fazer
Ainda é muito cedo para um data warehouse e para análises baseadas em SQL – simplesmente leva muito tempo. Todo o tempo deve ser gasto produzindo, não analisando, e a maneira mais direta de fazer isso é usar os recursos de relatórios integrados dos vários softwares que provavelmente são utilizados para administrar os negócios. Também não é hora de contratar um analista de dados em tempo integral. Existem coisas mais importantes para se investir no momento para tracionar o negócio.
Estágio Inicial
(20 a 50 funcionários)
É aqui que as coisas ficam interessantes e onde as mudanças nos últimos dois anos realmente começam a se tornar aparentes. Nesse estágio, a empresa começa a ter novas opções.
Todas essas opções são orientadas pela tecnologia analítica que está cada vez melhor e mais rápida. Anteriormente, esse tipo de infraestrutura era reservada para empresas muito maiores. E os benefícios são métricas mais confiáveis, mais flexibilidade e uma plataforma melhor para crescimento futuro.
O que fazer
-
Configurar a infraestrutura de dados. Isso significa escolher um data warehouse, uma ferramenta ETL e uma ferramenta de BI.
-
Contratar um líder de análise. Aqui é valioso encontrar um bom profissional que será capaz de agregar valor no dia 1, mas que também será capaz de contratar a equipe ao seu redor conforme a empresa cresce. Deve ser capaz de arregaçar as mangas e colocar a mão na massa e concentrar-se em contratar alguém que possa pensar sobre os dados e sobre o negócio estrategicamente.
-
Considerar contratar um consultor. Os erros cometidos neste estágio crítico têm sérios custos de tempo e dinheiro à medida que a empresa cresce, por isso é importante estabelecer uma base sólida, especialmente em relação aos componentes do stack de tecnologia e a resolução de problemas de análise. Para fazer isso, mais startups hoje estão optando por trabalhar com consultores para ajudá-los a se preparar e, em seguida, formar uma equipe em torno dessa infraestrutura.
O que não fazer
-
A menos que o aprendizado de máquina seja uma parte essencial do produto, não se recomenda contratar um cientista de dados ainda. Aqui é preciso um profissional mais generalista, não um especialista, para formar a equipe de análise.
-
Não construir os próprios pipelines ETL. Isso irá desperdiçar muitas horas de tempo de engenharia. Adquira uma solução já pronta.
-
Não tentar “se safar” usando um banco de dados mais tradicional como data warehouse. Não é muito mais barato e será difícil trocar mais tarde.
Estágio intermediário
(50 a 150 funcionários)
Este estágio é potencialmente o mais desafiador. A equipe ainda é relativamente pequena e tem poucos recursos, mas é necessário fornecer análises cada vez mais sofisticadas e diversificadas para os negócios, e esse trabalho pode impactar diretamente o sucesso ou o fracasso da empresa como um todo.
É importante progredir aqui e, ao mesmo tempo, certificar-se de continuar a lançar as bases para as fases futuras do crescimento.
O que fazer
-
Implementar um processo sólido para modelagem de dados baseada em SQL.
-
Aumentar a equipe que pensa o negócio. O núcleo da equipe deve majoritariamente de analistas de BI: pessoas que são especialistas em SQL e na plataforma de BI escolhida. Eles passam seu tempo trabalhando com líderes de negócio para atender suas solicitações de insights e inteligência. Aqui sim se contrata o primeiro cientista de dados e descobrir o perfil dessa pessoa e como equipá-la é extremamente importante. Lembrando que é fundamental ter a equipe de infraestrutura de dados e análise já estabelecida antes de contratar talentos experientes (e caros) em ciência de dados.
-
Começar a enfrentar seletivamente alguns desafios de previsão. A previsão é evidentemente mais difícil do que apenas fazer contagem, mas existem algumas áreas principais nas quais faz sentido começar a mergulhar. Se a empresa é de SaaS, deve-se trabalhar em um modelo de previsão de churn. Se é e-commerce, é absolutamente necessário trabalhar em um modelo de previsão de demanda. Esses modelos provavelmente não serão extremamente sofisticados, mas serão uma grande melhoria em relação aos trabalhos feitos no Excel,
-
Gastar tempo e energia tentando descobrir sua atribuição de marketing. A questão é ampla, mas basta dizer que simplesmente não se pode confiar essa questão crítica de negócios a terceiros.
O que não fazer
É fácil se deixar levar por você mesmo e começar a investir em infraestrutura de dados robusta. Não faça isso. Nesse estágio, grandes investimentos em infraestrutura ainda são uma distração dispendiosa. Aqui estão algumas sugestões sobre como permanecer ágil:
-
Empurre SQL e seu data warehouse com força. Compre a potência necessária para o data warehouse – pagar por servidores é muito mais barato do que pagar por humanos.
-
Encontre formas de baixo custo para conjuntos de dados ETL que não têm integrações prontas para uso.
Estágio de crescimento
(150 a 500 funcionários)
Nesse estágio o foco é a criação de processos analíticos em escala. É preciso equilibrar a obtenção das respostas necessárias no momento atual com a implementação de práticas analíticas que serão escalonadas à medida que a equipe continue a crescer.
Com 150 funcionários, provavelmente haverá apenas uma pequena equipe (3-6) em tempo integral com foco em análises. Quando houver 500 funcionários, poderá facilmente ter 30 ou mais. 3-6 analistas podem operar de uma maneira bastante ad-hoc, trocando conhecimento (e códigos) informalmente. No momento em que forem mais de 8 analistas, isso começa a se quebrar muito rapidamente.
Se essa transição não for bem gerenciada, o desempenho será pior à medida em que a equipe crescer. Levará mais tempo para produzir insights significativos e as respostas serão de qualidade inferior. Isso é simplesmente uma função da complexidade não linear: mais dados sendo produzidos e mais analistas trabalhando com eles. Para combater isso, é preciso processos para mantê-los trabalhando juntos de forma confiável.
O que fazer
-
Implementar o teste de dados. Há dados fluindo para o warehouse de pelo menos uma dúzia de fontes neste ponto e é necessário um processo para garantir que os dados que estão sendo carregados continuem em conformidade com as regras esperadas. Se não houver um processo automatizado sólido que verifique essas coisas, a qualidade da análise continuará a degradar sem saber por quê.
-
Levar a documentação a sério. O ambiente de dados na empresa é complicado. A única maneira de gerenciar esse conhecimento com eficácia e compartilhá-lo com a equipe é investir o tempo e a energia necessários em documentação. Por mais que pareça que esse tipo de processo gera mais sobrecarga de trabalho, na verdade isso é um investimento de tempo. Porque se a documentação não for bem feita, os analistas acabam gastando mais energia descobrindo onde obter determinados dados ou como usá-los do que realmente conduzindo análises. A Airbnb tem feito um excelente trabalho nesta área.
-
Seja assertivo em relação à estrutura da equipe de análise. Existem dois modelos principais de como estruturar uma equipe analítica: centralizado e integrado. Não há uma resposta certa e clara, mas essa decisão será fundamental para a forma como você fornece análises para sua organização em crescimento. Carl Anderson descreve bem as compensações em seu livro Creating a Data-Driven Organization.
O que não fazer
Calibrar mal o nível de exigência. Fazer análises certas nesse nível é um trabalho árduo e requer uma equipe talentosa e motivada que está constantemente inovando e melhorando. As revisões de código levam tempo e energia. Os analistas não estão acostumados a ter que testar seu código. E a documentação é meticulosa. Haverá resistência em fazer as coisas dessa maneira, especialmente entre os membros de sua equipe de longa data que se lembram dos “bons velhos tempos”. Mas conforme a complexidade aumenta, é preciso evoluir processos para se adaptar.
Na verdade, esses processos tornarão a análise mais fácil, rápida e confiável, mas implementá-los será difícil. Se você leva a sério o dimensionamento da análise, vai avançar.