Com a evolução da Inteligência Artificial e de outras inovações tecnológicas de modo geral, muitas empresas acabam negligenciando o que continua sendo o principal ativo de qualquer negócio: seu capital humano.
Ainda que a análise de dados possa, de fato, proporcionar um diferencial significativo para a organização em vários aspectos, não se deve perder de vista o que está por trás de tudo isso, que são justamente as pessoas.
O negócio pode ser orientado para dados, mas a cultura organizacional precisa ser orientada para pessoas. Para que a inserção de novos softwares e recursos tecnológicos seja realmente produtiva, os colaboradores precisam se sentir à vontade e confiantes para utilizá-los da melhor maneira, para reconhecer seus benefícios e para serem promotores das iniciativas “data-driven” dentro da organização.
Para isso, a alfabetização em dados é essencial. Data literacy é a capacidade de ler, entender, criar e comunicar dados como informação. Assim como a alfabetização como um conceito geral, a alfabetização em dados concentra-se nas competências envolvidas no trabalho com dados.
Recentemente, a Qlik e a Accenture realizaram uma pesquisa com mais de 9 mil entrevistas (com pessoas de diversos segmentos da indústria, desde C-leves até iniciantes, em nove países da América do Norte, Europa e Ásia-Pacífico) e produziram um relatório sobre o atual cenário da alfabetização em dados nas empresas.
O report traz uma realidade um pouco preocupante: embora gestores considerem que estão desenvolvendo ações no sentido de serem orientados por dados (data driven), o ritmo muito acelerado de algumas mudanças está acabando por causar sentimentos de ansiedade, medo, sobrecarga, incerteza e até tristeza entre os colaboradores.
Segundo dados da pesquisa realizada, 74% dos respondentes relatam se sentir infelizes (despreparados, inseguros) ao trabalhar com dados.
Fonte: The Human Impact of Data Literacy | Qlik & Accenture
As máquinas são capazes de processar um volume cada vez maior de dados e informações, com mais sofisticação e agilidade, fazendo milhares de combinações e até imitando o comportamento de seres humanos, por exemplo, ao sugerir determinadas respostas aos usuários de um serviço.
Assim, é inevitável que elas sejam cada vez mais desejadas e utilizadas para automatizar diversos processos dentro das companhias. Acontece que, como mencionado acima, isso tem causado aflição e sobrecarga aos funcionários, que precisam lidar com uma montanha de informações, atualizações e novas ferramentas a cada dia.
Mas, mesmo se sentindo incomodados ao lidar com dados, reconhecem que estes são um ativo das organizações em que trabalham e acreditam treinamentos em alfabetização de dados os fariam mais produtivos.
Fonte: The Human Impact of Data Literacy | Qlik & Accenture
Fonte: The Human Impact of Data Literacy | Qlik & Accenture
A importância de investir em treinamento
Sem dúvidas, as pessoas produzem mais e melhor quando estão se sentindo bem, sendo valorizadas e reconhecidas. Portanto, é indispensável investir tempo e dinheiro em treinamento de pessoal.
Não são somente rapidez e precisão — seguramente proporcionadas pelos algoritmos — que importam no cenário atual. Ainda que os dados sejam tidos como matéria exata e racional, os desafios atuais exigem também preparo dos profissionais para entenderem e terem criatividade para lidar com tais dados (desde o pensamento em soluções de engenharia de software até a análise das informações).
Se não houver, então, pessoas qualificadas e devidamente preparadas para classificar, analisar e transformar dados em recursos, os esforços para introduzir novas tecnologias e ferramentas de análise de dados na organização, muito provavelmente se mostrarão infrutíferos.
Todavia, o cenário é de abertura para aprender: mais de um terço dos entrevistados na pesquisa da Qlik-Accenture declararam acreditar que obter treinamentos em data literacy os fariam mais produtivos.
Segundo Jordan Morrow, Data and Analytics Executive na Qlik, “esperar que os funcionários lidem com dados sem fornecer o treinamento certo ou as ferramentas apropriadas é como pescar sem as varas, iscas ou redes”.
Disseminação da “cultura de dados”
Cultura é um elemento fundamental dentro as organizações. Segundo Laraia, antropólogo brasileiro e autor do livro “Cultura, um conceito antropológico”, devemos entender o homem como um ser predominantemente cultural: seus comportamentos, ações e pensamentos não são biologicamente direcionados, mas dependem inteiramente de um processo de aprendizado. Isso vale para os ambientes familiares, entre amigos, para questões culturais de um país inteiro e, claro, para os espaços profissionais.
Mas, conforme ressaltado, muitas vezes, mesmo em tentativas de se envolver as pessoas que compõem uma organização em geral numa “nova realidade” data driven, tem sido gerada uma ansiedade generalizada — decorrente (1) da falta de entendimento dos diferentes níveis de maturidade das pessoas para lidarem com informações sobre dados, matemática, estatística, programação, etc.; (2) da velocidade com que as mudanças ocorrem, sem preparo prévio; e, claro, (3) da falta de treinamentos adequado para que os colaboradores possam manipular (ou entender) novas ferramentas e projetos, e sentir que são parte fundamental dessas mudanças.
Lorin Witt, professor da The Wharton Business School e autor do Índice de Alfabetização de Dados da Qlik, descobriu que as oportunidades de negócios no “mundo dos dados” são sustentadas por três elementos principais: melhoria do acesso a dados, habilidades/competências mais fortes em dados e uma cultura que capacita toda a organização para tomadas de decisão baseadas em dados.
Segundo dados levantados pela Qlik e Acentture, o percentual mais alto de empresas que declaram dar a todos acesso a ferramentas de dados (como dashboards analíticos) projetadas especificamente para o trabalho de seus colaboradores ou apropriadas para seu nível de habilidade é de 28% (nas empresas do setor de ciência e tecnologia; nas organizações do setor público esse número chega a 13%).
Fonte: The Human Impact of Data Literacy | Qlik & Accenture
Fonte: The Human Impact of Data Literacy | Qlik & Accenture
A visão sobre a democratização dos dados ainda não tem sido, portanto, a abordagem dominante nas empresas, nas quais a propriedade dos dados e sua análise ficam nas mãos de alguns especialistas.
Estas equipes (compostas, muitas vezes, por cientistas de dados) têm forte compreensão e vasta experiência em dados e processos de negócios. Elas têm a tarefa de fornecer maior valor comercial, melhorando as operações e modelos existentes e desenvolvendo novos — mas, nem sempre são encarregados de difundir esta expertise, visão e os benefícios trazidos pelos dados para toda organização.
Os impactos do uso de dados na cultura organizacional
Um ponto extremamente importante, portanto, é buscar incluir as pessoas e envolver todos os setores na análise de dados, quebrando barreiras e ultrapassando as questões técnicas, para democratizar e desmistificar o acesso aos dados. Dessa forma, a empresa pode se beneficiar como um todo.
Isso também impacta em aspectos relevantes da cultura, estimulando a troca de experiências e conhecimentos, a colaboração entre pares, independentemente da área, e o aprendizado contínuo.
Ter uma cultura forte e saudável e preparar as pessoas para lidarem de forma tranquila e eficiente com decisões baseadas em dados são questões estratégicas não apenas para construir um ambiente corporativo mais humanizado e agradável — características cada vez mais valorizadas pelo mercado — mas também para otimizar os resultados, inclusive financeiros.
Funcionários insatisfeitos e ansiosos podem acabar, inconscientemente, contaminando a cultura da empresa e/ou ficando desmotivados.
Quando contabilizadas lentidão na execução de processos e licenças médicas fruto de estresses resultantes de questões associadas a dados e tecnologia, as empresas perdem em média mais de cinco dias úteis (43 horas) por colaborador, por ano.
Fonte: The Human Impact of Data Literacy | Qlik & Accenture
Claro que mudanças na cultura não acontecem do dia pra noite, mas é fato que ela está em constante movimento. Sabendo disso e do quanto este é um pilar fundamental, os gestores devem estar sempre atentos, buscando compartilhar essa responsabilidade de desenvolver uma cultura justa e baseada em valores que façam sentido para as equipes, em consonância com os interesses da organização.
Dessa forma, a inclusão digital se torna um processo menos estressante e com melhores resultados, já que as pessoas estarão mais abertas e dispostas a incorporar novas ferramentas em sua rotina de trabalho, compreendendo mais a fundo não só as funcionalidades relativas a essas tecnologias e dados, mas os ganhos que ela pode ter com isso e, consequentemente, se interessando de forma mais genuína por análises, dados, etc.
Antes de investir milhões em projetos de uso de dados, portanto, invista em pessoas, pois elas são a chave para o sucesso das estratégias de data science e de quaisquer outros projetos. Se for preciso dar um passo atrás ou desacelerar o ritmo de implantação das análises para alfabetizar os colaboradores no que tange aos dados de forma mais cautelosa, inclusive tornando isso atraente para essas pessoas — e não só para os que estão habituados aos dados —, não hesite. Os resultados em médio e longo prazo se justificarão.