Machine Learning roubará empregos? Uma perspectiva científica

 


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Embora muito seja dito sobre robôs capazes de roubar empregos de seres humanos, o método por trás dessas previsões nem sempre é devidamente esclarecido. Pesquisadores investigaram o verdadeiro impacto de Machine Learning na força de trabalho, em um caso que ilustra a importância do rigor científico.

Qual é o assunto da pesquisa?

 

Em tempos digitais, o impacto da Inteligência Artificial nas oportunidades de emprego é um questionamento constante. No entanto, ainda que muito seja dito sobre robôs que serão capazes de roubar empregos de seres humanos, é importante verificar qual é o conhecimento científico que está sendo produzindo sobre essa questão.

 

Embora seja comum ouvir previsões grandiosas sobre o impacto da automatização no trabalho, o método por trás desses prognósticos nem sempre é devidamente esclarecido. Quando tais previsões embasam a tomada de decisão de gestores, o caso fica mais grave ainda. Em busca do preenchimento dessa lacuna, uma parceria entre pesquisadores do MIT e da Universidade Carnegie Mellon buscou investigar o verdadeiro impacto de Machine Learning nos empregos.

 

Os pesquisadores definem Machine Learning como um subcampo da Inteligência Artificial, que estuda “como construir programas de computador que melhoram automaticamente, por meio da experiência, o desempenho em alguma tarefa”. O progresso recente em Machine Learning foi impulsionado, em grande parte, por uma abordagem chamada Deep Learning. Ela tornou possível que as máquinas alcançassem ou até mesmo ultrapassassem seres humanos em certos tipos de tarefas, especialmente aquelas relacionadas a reconhecimento de imagem e fala, processamento de linguagem natural e análises preditivas.

 

Até agora, os efeitos econômicos percebidos são pequenos em relação ao potencial oferecido por essa tecnologia. Isso reflete os anos (ou décadas) necessários até que as tecnologias gerem valor econômico substancial. Empreendedores e inovadores levam tempo para adotar novas técnicas, reconfigurar o trabalho existente, descobrir novos processos de negócios e inventar tecnologias complementares. A reorganização da atividade econômica é um importante determinante do retorno à inovação.

 

A preocupação com o impacto da automatização no emprego está crescendo. Um estudo da McKinsey sugeriu que cerca de metade das atividades de trabalho desempenhadas por seres humanos poderia ser automatizada com a tecnologia disponível atualmente.

 

Embora os avanços em Machine Learning sejam impressionantes e a automatização já tenha efeitos significativos em muitas partes da força de trabalho, ainda estamos longe de uma Inteligência Artificial Geral, que se equipararia aos seres humanos em todas as áreas cognitivas. Isso levanta a questão sobre quais tarefas serão mais afetadas por Machine Learning e quais serão relativamente não afetadas.


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Qual foi o método utilizado?

 

Os pesquisadores examinaram quais canais da força de trabalho poderiam ser afetados por Machine Learning. Para isso, eles avaliaram o potencial de aplicação de Machine Learning em 18.156 tarefas e 964 ocupações de trabalho, levantadas por meio do banco de dados O*NET. Esse banco pertence ao Departamento de Trabalho do governo norte-americano e contém dados sobre habilidades, conhecimentos, atividades e interesses associados a ocupações de trabalho.

 

O potencial de aplicação de Machine Learning foi avaliado segundo uma escala publicada pelos mesmos autores na Science – uma das revistas científicas mais importantes do mundo. Nessa escala, as tarefas eram avaliadas segundo critérios como “funções de entrada e saída bem definidas”, “a tarefa fornece um feedback claro, com metas e métricas claramente definíveis” e “a função aprendida não muda rapidamente com o tempo”.

 

A partir dessa escala, os pesquisadores construíram medidas do que chamaram de “adequação para Machine Learning”, o que permite discutir o verdadeiro potencial de reorganização na força de trabalho.

 

Resultados

 

Um ponto-chave do estudo é que ele enxerga as ocupações de trabalho como um conjunto de tarefas. Algumas destas oferecem melhores aplicações para tecnologia do que outras. Logo, o impacto de Machine Learning no mercado de trabalho é uma função da adequação para Machine Learning de atividades de trabalho específicas.

 

Assim, a eficácia que a tecnologia oferece especificamente para diferentes tarefas sugere que o impacto da difusão de Machine Learning será desigual entre as ocupações. A tabela a seguir mostra as ocupações com menor e maior índice de adequação para Machine Learning. 


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Os pesquisadores descobriram que 1) a maioria das ocupações, na maioria das indústrias, tem pelo menos algumas tarefas que são adequadas para Machine Learning; 2) pouquíssimas ocupações (se é que existe alguma) possuem todas as tarefas adequadas ao Machine Learning; e 3) o desencadeamento do potencial de Machine Learning exigirá que o conteúdo das tarefas seja significativamente redesenhado, visto que tarefas adequadas e não adequadas para Machine Learning são desagregadas dentro das ocupações.

 

As descobertas sugerem que é necessária uma mudança no debate sobre os efeitos da Inteligência Artificial no trabalho. Os pesquisadores mostram que é importante manter distância do foco comum que prevê a automatização total de muitos empregos e a substituição perene de ocupações. No lugar disso, é interessante que a reflexão caminhe em direção a novos desenhos de empregos e novas engenharias de processos de negócios.

 

As evidências sugerem que as tecnologias de Machine Learning serão realmente difundidas, mas que, dentro das ocupações, as tarefas de trabalho variam muito em relação à adequação para Machine Learning.

 

Os pesquisadores ainda sugerem que a variabilidade na adequação para Machine Learning no nível das tarefas seja um indicador da possível reorganização de um trabalho. Isso porque as tarefas de alta e baixa adequação de Machine Learning, em um mesmo trabalho, podem ser separadas e reempacotadas. Assim, o foco de futuras pesquisas, gerentes e empreendedores, não deve ser (apenas) a automatização, mas também esses novos possíveis desenhos de trabalho.