
Pesquisadores demonstraram como dados podem fornecer um ponto de equilíbrio entre o trânsito na cidade e interesses de passageiros e motoristas.
The Upshot, canal do New York Times especializado em jornalismo de dados, publicou recentemente um artigo sobre as dificuldades de se definir o tamanho ideal da frota de táxis, Ubers e similares que uma cidade deveria comportar. Os possíveis caminhos para a resolução da questão ilustram bem como um problema pode ser resolvido por meio da lógica de Data Science.
Há diversos interesses em jogo quando se tenta definir o melhor número de carros para um centro urbano. Passageiros querem a maior frota possível, para que não precisem esperar ao pedir um carro. Porém, um sistema assim provavelmente teria muitos carros vazios esperando por viagens, o que aumentaria o trânsito e diminuiria o salário médio dos motoristas. Assim, o artigo afirma que a frota ideal é definida por um ponto de equilíbrio entre todos os interesses: conveniência e trânsito, salários altos e pouca espera, o que é melhor individual e coletivamente.
Segundo alguns pesquisadores, a melhor maneira de definir esse ponto de equilíbrio é utilizar métricas que digam o quanto os táxis ou Ubers são de fato utilizados – ou seja, quanto tempo ou quanta distância percorrem, de fato, com um passageiro. Sistemas que fornecem muitas viagens improdutivas acabam por desperdiçar espaço na rua e são pouco lucrativos para os motoristas.
Alejandro Henao – um pesquisador de pós-doutorado no Laboratório Nacional de Energia Renovável, instituto norte-americano de pesquisa científica – realizou um estudo que tenta desvendar esse ponto de equilíbrio.
Em primeiro lugar, Henao se deparou com uma grande dificuldade de obter dados com empresas de aplicativos de carona – tais como Uber e Lyft. Desta maneira, ele utilizou dados do RideAustin, um aplicativo de caronas sem fins lucrativos. Ele foi criado em Austin, no Texas, em um momento em que aplicativos similares suspenderam sua atuação na cidade em virtude de problemas legais. O RideAustin disponibilizou parte dos dados de suas viagens por meio do site Data.World, com o intuito de promover pesquisa e análise.
Os dados consistiam em informações sobre 1,5 milhões de viagens realizadas entre junho de 2016 e abril de 2017. O pesquisador calculou o número de motoristas ativos (ou seja, que estavam realizando uma viagem com passageiro) e o número de pedidos de viagem para cada intervalo de uma hora. Os resultados estão no gráfico a seguir.

O gráfico apresenta uma correlação estatisticamente significativa entre oferta e demanda para as viagens realizadas com o RideAustin. As descobertas desta análise sugerem que há um número um pouco maior de motoristas do que de usuários (ou solicitações) no conjunto de dados e que, caso fosse utilizada uma estratégia de alocação de frota ideal, há grande probabilidade de satisfazer a demanda de viagens existente sem causar grandes impactos no sistema.
Em seguida, Henao calculou o tamanho do deslocamento feito com o carro vazio – tanto aguardando a próxima viagem quanto em busca de uma viagem que já foi solicitada. Assim, foi explorada a relação entre deslocamento vazio e a demanda de viagens. O resultado pode ser visto no próximo gráfico.

O gráfico mostra que existe uma relação não-linear entre o índice de deslocamento vazio e a demanda. Além disso, os resultados sugerem que o ponto ótimo dessa relação ocorre quando o motorista atende, em média, 3,4 viagens por hora. Ou seja, quando o motorista consegue atender esse número de viagens, ele realiza o mínimo possível de deslocamento vazio.
Para alcançar esse ponto ótimo, as empresas de aplicativos de carona deveriam ter como meta a disposição, a cada uma hora, de uma frota de 30 motoristas para cada 100 pedidos de corrida. Para além desse ponto, caso mais viagens fossem adicionadas para os motoristas, isso não economizaria a distância percorrida com o carro vazio. Além disso, um sistema assim provavelmente teria muitos passageiros e não teria motoristas suficientes, o que faria o tempo de espera aumentar. Embora essa análise se concentre na cidade de Austin, Henao afirma que esses resultados podem fornecer insights para outras cidades e regiões.
Segundo Alejandro Henao:
As cidades deveriam otimizar o número de motoristas segundo a demanda – ou incentivar as empresas a fazerem isso de forma mais eficaz, exigindo que compartilhem suas taxas de utilização. As cidades poderiam reter licenças de empresas com baixa utilização, por exemplo, e recompensar aquelas com taxas altas.
O artigo do New York Times chama a atenção para a suspeita de que, em Nova Iorque, as empresas de aplicativos de carona teriam impulsionado o tamanho da frota para minimizar o tempo de espera dos passageiros, às custas do salário médio dos motoristas e das ruas públicas. O prefeito da cidade, Bill de Blasio, teria afirmado que:
O modelo de negócios da Uber é inundar o mercado com o maior número possível de carros e motoristas.
No entanto, os responsáveis pelo Uber argumentam que estão comprometidos em equilibrar todos os interesses envolvidos e estão mais determinados em resolver o impasse do que a indústria de táxis jamais esteve. A empresa aplica políticas de tarifa diferenciada segundo a demanda de veículos, uma estratégia que busca administrar o suprimento de veículos em locais com maior necessidade.
Josh Gold, relações públicas do Uber, afirmou:
Escolher um número de veículos não é a melhor maneira de atender moradores de cidades inteiras – basta olhar para os táxis amarelos em Nova York, que fazem 92% de suas viagens em Manhattan. Em última análise, temos um incentivo natural para manter os motoristas ocupados; caso contrário, eles não escolherão continuar dirigindo conosco.
Sobre os táxis nova-iorquinos, pesquisadores do M.I.T. publicaram na revista Nature um artigo no qual sugerem que, se os táxis tradicionais otimizassem suas rotas segundo a demanda – tal como acontece no Uber – eles poderiam entregar o mesmo número de viagens com 30% a 40% menos veículos.
A cidade de Nova Iorque tem 13.600 táxis registrados e cerca de 8.000 estão na rua simultaneamente. Isso significa que a frota poderia fornecer as mesmas viagens com cerca de 5.000 veículos. É uma demonstração que ilustra bem as melhorias de eficiência que conseguimos alcançar por meio do uso da lógica de Data Science. Não é à toa que aplicativos como Uber e Lyft nasceram em São Francisco, em uma junção da inteligência disponível no Vale do Silício com uma forte demanda por transporte.