O agronegócio entrou na era digital há pouco tempo e muitas soluções inovadoras baseadas em dados estão surgindo e potencializando a produção de fazendas em grande escala para corresponder ao aumento da demanda por alimentos no mundo.
O agronegócio entrou na era da tomada de decisão baseada em dados. Até a década de 1920, se encontrava no estágio pré-industrial, que consistia em mão-de-obra manual e era repleta de pequenas fazendas voltadas a alimentar uma família apenas. O segundo estágio aconteceu a partir de 1920 até por volta de 2010 e podemos chamá-lo de agricultura industrial, onde havia tratores, colheitadeiras, fertilizantes químicos, criando-se grandes fazendas comerciais com enormes ganhos de produtividade. Na última década, entramos no terceiro estágio, a Agricultura 3.0, que está em fase inicial e envolve exploração de dados de muitas fontes, com sensores em equipamentos e plantas agrícolas, imagens de satélite, rastreamento do clima e o monitoramento detalhado das plantações.
Todo esse esforço em volta do setor é para corresponder a demanda por alimentos crescente no mundo. Em 2050, a população global deve chegar a 9 bilhões de pessoas, enquanto hoje são cerca de 7,7 bilhões. Para alimentar todo mundo, a produtividade agrícola mundial terá que aumentar de 1,5 toneladas de grãos por acre para 2,5 toneladas até 2050 (1 acre = 0,40 hectare ou 4.047 m²). Inclusive, um dos objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas é dobrar a produtividade agrícola e a renda dos agricultores em países em desenvolvimento e ajudá-los a reduzir a fome no mundo.
O fato é que a Ciência de Dados está mudando a maneira como os agricultores e profissionais agrícolas tomam decisões. Tecnologias de Internet das Coisas (IoT) atualmente disponíveis tornam possíveis coletar dados de solo, água e minerais de fazendas e armazená-los em um sistema centralizado, compartilhando dados de forma independente. Esses dados podem ser combinados com dados de fontes externas, como satélites, estações meteorológicas e até mesmo dados de fazendas vizinhas para formar um volume maior. A análise de dados pode ser usada no volume acumulado para obter informações para otimização de todo o processo produtivo, desde o planejamento, passando pelo plantio e colheita, até sua comercialização.
Soluções e inovações baseadas em dados
Os agricultores constantemente fazem malabarismos entre um conjunto de variáveis e tomam decisões agrícolas. Para cultivar uma variedade de safras é preciso planejar o que vai ser cultivado, onde e quando. Em seguida, há decisões sobre a irrigação, fertilizantes e pesticidas a serem usados. Depois, vem a decisão sobre o momento certo de colher e enviar os produtos ao mercado. Na maioria dos casos, este método é baseado no empirismo, na prática e conhecimento relativo a cada agricultor.
Mas agricultores já podem usar os dados para ajudá-los a tomar essas decisões complexas sobre sua fazenda e safras. Neste contexto é necessário obter todas as variáveis para obter o ganho máximo de produtividade. Os dados obtidos usando sensores dentro da fazenda, como os de nutrientes do solo, conteúdo de água, permeabilidade do ar, etc. (também chamados de dados localizados) podem ser usados separadamente ou com dados de fontes externas como temperatura e chuva para obter diferentes tipos de informação.
A disponibilidade de dados localizados e externos pode ajudar na prática da chamada agricultura de precisão, que gira em torno da sustentabilidade e do uso de recursos na medida certa, sem desperdiçá-los. Por meio da agricultura de precisão, as plantas podem ser avaliadas e suas necessidades de minerais, fertilizantes e água podem ser atendidas individualmente. Somente as plantas que não têm recursos suficientes podem ser abastecidas com o que precisam. Assim, muitos recursos podem ser economizados por este método e, finalmente, o custo de produção será reduzido. Nos animais, a precisão pode ser obtida com a implantação de chips de Identificação por Radiofrequência (RFID), que ajudam a identificar os animais doentes, permitindo que sejam encaminhados para tratamento.
Diversas tecnologias atualmente já permitem que os dados também possam ser usados para identificar a qualidade do solo e dos frutos. O princípio da espectroscopia, por exemplo, permite passar diferentes comprimentos de onda de luz através de um objeto para que diferentes propriedades possam ser obtidas, como temperatura, massa, luminosidade e composição. Portanto, os dados da espectroscopia também podem ser usados para automatizar alguns processos nas fazendas, como a abertura e fechamento de aspersores de irrigação de acordo com o teor de umidade registrado no solo.
Dados que detectam a composição química no ar, solo e culturas podem ser disponibilizados na web para consulta dos consumidores, ajudando a construir a confiança entre os interessados e aumentar a adesão de clientes.
Uma iniciativa interessante é da israelense MyCrop, sistema inteligente e de autoaprendizagem em tempo real que leva em consideração a localização de cada agricultor, o clima e os dados de safra. Ele usa big data, aprendizado de máquina e o próprio smartphone para fazer “telemedicina para plantações”, fornecendo informações e recursos para embasar decisões mais inteligentes e mais rápidas. E um ponto importante: é voltada aos pequenos agricultores.
Já o agronegócio de grande escala praticamente transforma suas fazendas em fábricas, automatizando diversos processos com uma grande quantidade de computação. Na instalação da TH Milk, no Vietnã, a ciência de dados é utilizada para regular a qualidade da produção de leite em vacas, onde todas as vacas são marcadas com um chip RFID. O processo de ordenha é automatizado com sensores nas ventosas que podem detectar inflamações nas glândulas mamárias. Se for detectada inflamação, a máquina para o processo de ordenha e a vaca será marcada e verificada.
Na AfiMilk, também em Israel, um chip semelhante é anexado às pernas de cada cabra que rastreia seu movimento. Se a cabra não se mover por um longo período ou se apresentar padrões de sono ambíguos, é verificada a presença de doenças.
Problemas da Agricultura 3.0
Um dos principais problemas enfrentados na implementação da ciência de dados é que a indústria agrícola não aceita mudanças prontamente. O fato é que se tornar data-driven na fazenda requer altos investimentos, deixando os agricultores céticos quanto à mudança de seus métodos de cultivo. Logo, apenas os grandes agricultores podem se dar ao luxo, enquanto os pequenos ainda não conseguem fazer a transição para viver, de fato, a era da agricultura 3.0. No entanto, a tendência é que essas tecnologias se tornem mais acessíveis com o passar do tempo e a popularização das soluções.
Outro ponto é que agricultores com empreendimentos menores e com nível educacional mais baixo também podem não ser capazes de implementar a agricultura digital e discernir os dados que lhes foram fornecidos.
E um terceiro problema é típica de qualquer tipo de solução baseada em dados: a sua coleta, limpeza, armazenamento e distribuição através de canais seguros. Um agricultor deve arcar com o custo de instalação de sensores, armazenando-os em um servidor centralizado para dados localizados. O problema com os dados agrícolas é que eles vêm em várias formas e intervalos de tempo. Por exemplo, os dados de um sensor que fornece o conteúdo de água e o valor do pH do solo podem ser obtidos a qualquer momento, mas dados relativos ao estágio de maturação das frutas precisam ser coletados manualmente, não podem ser obtidos tão prontamente. Portanto, é necessário converter esses dados como no tempo ou agregá-los para que possam ser comparados com dados padrão de natureza e tipo semelhantes. Um padrão deve ser formulado e usado para uma determinada área e tipo de planta como linha de base para comparação.
Os agricultores também devem compartilhar seus dados locais com outros agricultores para que um grande volume de dados esteja disponível para realizar análises. E aqui também entra a importância da segurança da informação, porque esses dados podem ser mal utilizados, monetizados por outra parte ou podem introduzir concorrência desleal.
Em última análise, podemos afirmar com toda a certeza de que a agricultura vive uma nova era, baseada em dados para tomada de decisões. Porém, ela é uma realidade apenas para uma pequena parcela de grandes agricultores no mundo. Vamos ver, aos poucos, essa tendência se difundir e chegar aos agricultores de menor porte.